O turista-torcedor que desembarcar no Aeroporto Internacional de Brasília para acompanhar a partida inaugural da Copa das Confederações, em 15 de junho, pode receber uma “revista” de propaganda do Governo do Distrito Federal na qual consta uma cidade muito diferente da que será conhecida dali a pouco. No material, encontrado pelo aeroporto e presente em vários táxis da cidade, o Complexo Esportivo Ayrton Senna, onde é construído o Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, é retratado sem nenhuma conexão com a realidade.
Na propaganda do governo, produzida com papel e impressão de alta qualidade, quadras poliesportivas abandonadas ganham cores, ginásios esportivos abandonados aparecem como novos e prédios e pavilhões inexistentes surgem construídos. Basta uma visita ao complexo esportivo representado na peça publicitária para perceber uma diferença muito grande entre a realidade e o que é apresentado a quem não conhece o local.
Pior que a propaganda fantasiosa, o governo do Distrito Federal não possui nenhum plano concreto com projeto, licitação, prazos e estimativa de custo para a maior parte dos aparelhos esportivos existentes ali. “Esclarecemos que a imagem que consta no folder é apenas uma ilustração da área central de Brasília totalmente modificada”, afirma a nota da assessoria de imprensa da Secretaria Especial da Copa 2014 do DF enviada ao UOL Esporte. “Não corresponde integralmente aos projetos definitivos”, afirma o governo.
Só depois da Copa
Apesar de dizer que a reforma e a revitalização integral do complexo esportivo serão um grande legado do Mundial para a cidade, o governo do DF afirma que, até a Copa de 2014, será realizada apenas “a requalificação dos estacionamentos e áreas verdes”. Até lá, está prevista também a construção de um túnel, de mais de R$ 100 milhões, que ligará o estádio ao Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em frente ao complexo esportivo e onde funcionará o centro de mídia e imprensa durante a Copa do ano que vem.
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Por fim, até junho de 2014 também está prevista a reforma do Ginásio Nilson Nelson, um dos poucos locais bem conservados e em funcionamento do Complexo Ayrton Senna e que funcionará como Centro de Voluntários da Fifa durante a Copa do Mundo. O local já havia sido reformado em 2008 para receber o Mundial de futebol de salão da Fifa.
Descaso
Além do estádio, o Complexo Esportivo Ayrton Senna conta com dois ginásios – o Nilson Nelson e seu anexo, em uso, e o Claudio Coutinho, abandonado -, um complexo de piscinas, bilheterias, banheiros, quadras poliesportivas com arquibancadas, quadras de tênis, cine drive-in, o autódromo Nelson Piquet, pátios e áreas verdes.
GINÁSIO INTERDITADO HÁ 12 ANOS
- O ginásio Claudio Coutinho, no Complexo Esportivo Ayrton Senna, está interditado há 12 anos. Em 2011, a Secretaria de Esportes do DF afirmava que abriria uma licitação em 2012 para recuperar o local. “Primeiro nós vamos injetar recursos e trabalho no ginásio Cláudio Coutinho, por tudo que ele representa para o esporte do DF. Após feita esta realização, vamos discutir a reestruturação de todo complexo”, explicou na época à TV Globo o então secretário de Esportes do DF, Célio René. Em 2005, o governo chegou a anunciar recursos para uma reforma no local, mas nada foi feito. O Complexo Esportivo Ayrton Senna fica no Setor de Recreação Pública Norte em Brasília, dentro do Plano Piloto desenhado pelo arquiteto Lúcio Costa para a cidade, fundada em 1960. As instalações do complexo esportivo começaram a ser erguidas na década de 1970. Inicialmente, o ginásio era uma piscina coberta.
Tirando o Nilson Nelson, onde há jogos da NBB (liga nacional de basquete), seu anexo, onde há escolinha de esportes para crianças e jovens, e o complexo de piscinas, que também funciona, nada está em ordem por ali. Bilheterias e banheiros são utilizados como abrigos improvisados por moradores de rua. O ginásio Claudio Coutinho está interditado há 12 anos com problemas estruturais. As quadras esportivas estão deterioradas e sem condições de uso.
O cine drive-in (espécie de cinema ao livre em um estacionamento, onde os filmes são assistidos de dentro dos carros, comum nos anos 1950 e 1960), ainda em funcionamento e aberto diariamente à população, possui parte de suas construções em ruínas e equipamentos sucateados. Frequentadores do autódromo reclamam da má conservação da pista e das estruturas no local em geral.
Lixo se acumula espalhado pelo complexo. O mato está alto nos canteiros. Pátios são utilizados como estacionamento para os trabalhadores da obra do estádio. Buracos, escombros e bueiros abertos representam perigo para os poucos que se arriscam a frequentar o local em busca de lazer.
Um pátio para dezenas de ônibus do transporte público coletivo do DF ocupa boa parte do complexo esportivo.
‘Gestões que não priorizaram o esporte’
Para o governo do Distrito Federal, a situação é fruto “de anos de gestões que não priorizaram o esporte”. Questionada quais os planos da administração do governador Agnelo Queiroz (PT-DF) para a área, a pasta da Copa de 2014 afirma que a reurbanização faz parte de uma lista de 10 projetos na área central de Brasília.
Diz que quadras, o ginásio interditado e todo o complexo passarão por revitalização “logo após o Mundial de 2014”. No entanto, não apresenta qualquer informação concreta, como custos, prazos, projetos e licitações.