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quarta-feira, novembro 27, 2024
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Fifa e empresas dominam hotéis na Copa e deixam livres só 3% dos quartos

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O torcedor “independente” que adquiriu ingressos para acompanhar jogos da Copa de 2014 Brasil afora e ainda não reservou lugar para se hospedar tem motivo para ficar preocupado e se apressar. Nas grandes redes de hotéis das 12 cidades-sede do Mundial estão livres para a época da Copa apenas 3% dos quartos. É o que mostra pesquisa realizada pelo Fohb (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil) em 248 hotéis de 26 grandes redes hoteleiras nas capitais que receberão jogos da competição.

A Match Services AG — operadora de turismo oficial da Fifa que organiza a viagem das delegações e vende pacotes de hospedagem e ingressos VIP para a Copa em todo o mundo — já bloqueou (ou seja, fechou contratos para reserva antecipada) 45% dos quartos nos hotéis pesquisados. Outros cerca de 40% (previsão do setor) ficam reservados para grandes clientes corporativos tradicionais das empresas hoteleiras, e 12% dos quartos já foram vendidos para torcedores independentes. Assim, nos grandes hotéis das cidades-sede restam apenas cerca de 1.700 dos 55.894 quartos nos hotéis da pesquisa, que abrange 69% dos quartos disponíveis nas cidades-sede, sem contar outros meios de hospedagem como albergues.

Os números foram apresentados pela diretora executiva da entidade patronal das redes de hotéis, Flávia Matos, durante reunião nesta terça-feira (17) do Comitê Interministerial criado em outubro pelo governo federal para acompanhar a evolução dos preços para a época da Copa do Mundo. O encontro foi realizado em Brasília, no Ministério da Justiça. A Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), vinculada à pasta da Justiça, havia solicitado as informações para o Fohb e para os hotéis diretamente. Ao todo, para o torcedor comum sobram cerca de 15% dos quartos dos hotéis nas sedes durante a Copa. Os números são uma média já que locais como São Paulo e Rio de Janeiro terão alta ocupação durante todo o Mundial, enquanto Cuiabá e Manaus, por exemplo, que recebem apenas jogos da primeira fase, devem registrar diminuição na procura a partir da segunda fase da competição.

Em agosto, o UOL Esporte revelou que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) investigava a Match a pedido do MPF (Ministério Público Federal), já que a prática dos bloqueios poderia limitar a concorrência e estabelecer uma espécie de monopólio por parte da empresa. De acordo com resposta enviada pelo Cade à reportagem, a “investigação permanece em curso e ainda não há conclusão sobre o caso”.

Ao todo, até o início de dezembro, a Match oferecia hospedagem durante a Copa do Mundo em 813 hotéis de 108 cidades brasileiras, inclusive por meio da página oficial da Fifa na internet. Apesar de não haver um número oficial, de acordo com a Fohb a situação dos bloqueios verificada nos 248 hotéis associados pesquisados deve se repetir nos outros 565 hotéis oferecidos pela Match no Brasil. “Em alguns hotéis menores e independentes, que não contam com divulgação própria, vale a pena reservar o maior número possível de quartos para a Match, que será responsável por oferecer o local no mundo todo”, diz a diretora executiva da Fohb. Qualquer um pode comprar um “pacote hospitalidade” da Match com hospedagem nos hotéis onde ela tem reserva.

Lei de oferta e procura
Segundo Flávia, nos contratos que fechou com os hotéis, a Match possui até o dia 31 de janeiro para confirmar se ficará mesmo com os quartos que reservou. De acordo com ela, a empresa fechou um preço fixo com cada hotel, e oferece os quartos no período da Copa do Mundo por um valor cerca de 30% superior ao que pagará. A Match confirma a informação e explica que, destes 30%, 18% são “custos operacionais”.

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“Essa é uma prática absolutamente normal no mercado hoteleiro, não há nada de ilegal ou errado nisso”, diz a diretora do Fohb. “Em qualquer grande evento existe um operador oficial que organiza a viagem das equipes participantes, profissionais que trabalham na organização e oferecem estes mesmos pacotes para outros públicos”. Ela explica que um aumento no preço das diárias é inevitável em cidades que recebem grandes eventos, e que é difícil definir onde começa o abuso. De acordo com ela, as negociações da Match com os hotéis brasileiros começaram em 2007.

“Claro que práticas como aquele aumento verificado em Cuiabá, de quase 4.000%, são abusivas, mas quem define isso é o consumidor, que pode reclamar nos canais oficiais e se recusar a pagar o valor cobrado. Se houver alguma irregularidade, o Procon e o Cade podem impedir a venda, mas não tem como definir um limite de preço, depende da procura”, diz a diretora da entidade patronal. “No limite, se estiver caro demais não vai vender”. De acordo com ela, existe um limite natural para a elevação das tarifas, e casos como o de Cuiabá devem ser isolados no período da Copa. “A Copa é o maior evento corporativo do mundo. É natural que os participantes, organizadores e grandes empresas ocupem a maior parte do espaço”.

Match responde
Procurada pela reportagem, a Match afirma que nunca teve oportunidade de comentar o assunto, e explica que “para um evento da magnitude e complexidade da Copa do Mundo, é fundamental que um determinado estoque de hospedagem seja assegurado para grupos importantes como seleções, autoridades e imprensa, entre outros”, diz a nota enviada ao UOL Esporte. A empresa afirma que criou um fórum de turismo para discutir questões relativas ao Mundial e convidou a Embratur e o governo federal para participar, mas seus representantes nunca foram nas reuniões nem deram satisfações.

Dessa forma, a Match considera injusto os questionamentos do Cade sobre os bloqueios de quartos e composições de preços da empresa, lembra que o governo federal também reclamou de outras operadoras de turismo e diz que coopera com o Cade e a Senacon. A operadora diz que o principal compromisso da Match é “disponibilizar opções adequadas e suficientes de hospedagem em termos justos e com preços razoáveis”.

“As únicas entidades que devem obrigatoriamente adquirir a sua hospedagem da Match Services são a Fifa e as delegações das seleções participantes. Os motivos são a segurança, o marketing e outras considerações”, afirma a companhia suíça, por meio de sua assessoria de imprensa. “A Match Services concentrou-se em contratar estoques de quartos adequados aos propósitos das entidades que precisa atender”.

“A Match está proporcionando principalmente um serviço a grupos constituintes da Fifa. A sua missão principal é atender em primeiro lugar à comunidade da Fifa, formada pela própria Fifa, funcionários do COL e seleções, além de prestadores de serviços, parceiros comerciais e meios de comunicação. Com a exceção da Fifa/COL e das delegações das seleções, todos os outros membros da família da Copa do Mundo da Fifa recebem ofertas opcionais de hospedagem e, portanto, estão livres para reservar diretamente com os hotéis ou por meio de outros intermediários”, diz a resposta enviada à reportagem.

A Match diz que existem outras empresas oferecendo hospedagem para a Copa do Mundo, e que não é ela quem define os preços praticados pelos hotéis. “As tarifas asseguradas pela Match Services com os seus hotéis parceiros e com os que ela oferece aos seus clientes são, na grande maioria dos casos, razoáveis e comparáveis a preços fora da Copa do Mundo”.

Sem resposta
Questionado pela reportagem sobre a legalidade das reservas da Match, se isso configuraria uma formação de cartel, monopólio de mercado ou qualquer outra prática econômica ilegal, o Ministério da Justiça e a Senacon não responderam. A reportagem também ficou sem resposta do governo federal sobre qual seria o próximo passo do comitê interministerial, qual havia sido o resultado da última reunião e se já havia algum resultado prático do trabalho do grupo.

O Ministério da Justiça também foi perguntado sobre o que seria feito a respeito da denúncia registrada no Procon-MT, do hotel que aumentou a tarifa em até 4.000% no período da Copa, e se casos semelhantes haviam sido constatados em outras cidades-sede do Mundial mas também ficou sem resposta para isso.

A Associação dos Procons, que participa do comitê interministerial do governo federal, também foi procurada para se posicionar diante dos números e explicar se havia algo irregular na prática, mas também não respondeu.

De acordo com um estudo da Jones Lang LaSalle Hotels apresentado pelo Fohb ao governo federal, o Brasil possui hoje 10.000 hotéis, com 460.000 quartos. O Fohb representa 26 redes hoteleiras donas de 28% desse mercado. Nas cidades-sede da Copa, são 31% do número de hotéis. Segundo a Embratur, o Brasil possui 25 mil meios de hospedagem — de hotéis a albergues e casas de família que oferecem quartos.

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