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quinta-feira, outubro 30, 2025
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Especialistas analisam novas regras de bagagem; entenda o que muda. Medida pode encarecer preço de passagens

Projeto aprovado pela Câmara prevê mala de mão e despacho gratuito de até 23 kg, fortalece proteção ao consumidor, mas pode afetar o equilíbrio do setor aéreo e trazer elevação de tarifas

A Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que prevê alterações no embarque com bagagens, entre elas, a gratuidade para malas de mão e o despacho sem custo de bagagens de até 23 kg. O texto agora retorna ao Senado e, se mantido, representará uma mudança estrutural na relação entre consumidores e companhias aéreas no Brasil.

De acordo com Rodrigo Alvim, advogado atuante na defesa dos Direitos dos Passageiros Aéreos, existe a possibilidade de as passagens ficarem mais caras. “Infelizmente as companhias aéreas podem repassar os custos para o consumidor final. Ou seja, quem não despachava bagagem vai acabar pagando por quem despacha, já que as empresas não poderão cobrar isso diretamente”, avalia.

Marco Antonio Araujo Jr, advogado especialista em Direito do Consumidor e presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB, as mudanças aprovadas fortalecem a proteção legal do consumidor, elevando garantias hoje tratadas apenas por normas administrativas. “Ao mesmo tempo, o pacote tende a impactar o modelo de negócios das companhias aéreas, que podem rever tarifas, políticas comerciais e estrutura de custos”, analisa Marco Antonio.

Segundo ele, ainda é cedo para comemorar. “Ao que parece, a Câmara dos Deputados decidiu restabelecer diversos direitos que tinham sido retirados no passado, sem analisar os impactos financeiros que essas garantias trariam ao mercado. Se os direitos forem garantidos pelo Senado e sancionados pelo Executivo, há riscos efetivos de que os valores das passagens aéreas sofram reajustes relevantes, o que, de alguma forma, prejudicaria o consumidor”, alerta Marco Antonio.

Vale lembrar que, recentemente, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou um projeto semelhante, que também mantinha a gratuidade para a bagagem de 10 kg, mas a Câmara optou por analisar o próprio projeto, sem aguardar a versão dos senadores. Agora, os projetos tramitarão de forma independente.

“O desafio agora será equilibrar e harmonizar os direitos dos consumidores passageiros e a dinâmica real do mercado das companhias aéreas, garantindo, se possível, o acesso econômico ao transporte aéreo, a preservação de direitos essenciais do passageiro e a sustentabilidade econômica do setor. O debate no Senado e na sanção presidencial será decisivo para encontrar esse ponto de equilíbrio”, avalia Marco Antonio.

Entenda os detalhes do que a Câmara aprovou

A proposta restabelece o direito do passageiro de despachar, sem custo adicional, uma mala de até 23 kg em voos nacionais ou internacionais operados no país e deve trazer novos embates com as empresas.

“A medida reverte o modelo tarifário implementado desde 2017 pela ANAC, que prometia redução do preço das passagens com a cobrança de bagagem, promessa que não se concretizou. Contudo, pode haver reajustes no valor das tarifas, já que as empresas tendem a repassar o custo ao consumidor. Países que adotaram o modelo ‘bagagem inclusa’ convivem com tarifas mais rígidas e menor liberdade para o chamado ‘unbundling’ de serviços, o que pode reduzir a competitividade tarifária”, diz Marco Antonio.

Segundo Rodrigo Alvim, embora o passageiro volte a ter o direito de despachar gratuitamente uma mala de até 23 kg, a medida deve resultar em passagens mais caras. “Na prática, tudo que reduz a rentabilidade das companhias aéreas tende a impactar o valor final da tarifa. Se elas não podem cobrar por bagagem despachada, marcação de assento ou outros serviços, acabam ajustando o preço das passagens. E, caso a empresa não cumpra a regra, o consumidor deve registrar uma reclamação no site do Governo e buscar reparação por eventuais prejuízos financeiros”, explica Alvim.

No texto, também está previsto o direito, por lei, de embarcar com 12 kg de bagagem de bordo, além de uma bolsa ou mochila sob o assento. Hoje, a Resolução 400 da ANAC prevê apenas 10 kg.

“A mudança dá maior segurança jurídica, impedindo que a ANAC ou companhias reduzam o limite sem debate legislativo. A previsão de gratuidade do despacho quando faltarem espaços a bordo protege o consumidor contra prática comum de cobrança indevida no portão de embarque”, informa Marco Antonio.

Também ficou estabelecido o fim do “No Show” com cancelamento automático do trecho de volta, ou seja, a empresa fica proibida de cancelar o retorno caso o passageiro não compareça ao embarque de ida, exceto com consentimento expresso.

“É uma das medidas de proteção mais relevantes, pois combate prática considerada abusiva por entidades de defesa do consumidor. Pode, porém, obrigar as empresas a rever sua lógica de tarifas, já que muitas usavam essa política para evitar que consumidores comprassem passagens mais baratas em trechos específicos”, revê Marco Antonio.

No entanto, esse direito já é parcialmente previsto na Resolução nº 400 da ANAC, de acordo com Rodrigo Alvim. “No artigo 19, garante que, se o passageiro avisar com antecedência que não usará a ida, mas pretende embarcar na volta, a empresa não pode cancelar a passagem”, ressalta.

Há ainda a previsão da gratuidade na marcação de assentos padrão. Assentos comuns, que não sejam especiais, como saídas de emergência, deverão ser oferecidos gratuitamente no momento da compra ou do check-in. “A medida garante transparência e evita a ‘venda fatiada’ de serviços essenciais ao transporte. Impacta receitas acessórias das companhias, que vinham crescendo nos últimos anos. Pode gerar aumento no valor das tarifas para compensação – fenômeno observado em mercados europeus quando regras semelhantes foram impostas”, alerta Marco Antonio.

O texto garante ainda, sem custo adicional: até dois assentos adicionais, se indispensáveis à acomodação; ajudas técnicas e equipamentos médicos necessários ao transporte.

“A medida alinha o Brasil a padrões internacionais de acessibilidade aérea. Amplia a inclusão e reforça princípios de dignidade, mas exigirá adequação operacional das companhias aéreas”, avalia o presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB.

 

Há ainda a criação do banco de negativação dos passageiros. A proposta autoriza as empresas a banir por até 12 meses passageiros que pratiquem atos gravíssimos de indisciplina a bordo, com compartilhamento da penalidade entre as companhias. A medida atende pleito das empresas diante do aumento de casos de agressões, desacato e desordem em voos, mas exigirá regulamentação clara para evitar abusos e garantir contraditório e ampla defesa. “É preciso equilibrar segurança de voo com garantias de direitos”, destaca Marco Antonio.

Próximos passos

O texto retorna agora ao Senado para apreciação final. Os parlamentares poderão confirmar integralmente a medida, alterá-la novamente ou ainda rejeitar pontos e enviar à sanção presidencial com ajustes.

“Dada a forte pressão das companhias aéreas e possíveis impactos econômicos, é previsível que alguns dispositivos sejam objeto de veto”, diz Marco Antonio.
Sobre a possibilidade de alterações no texto do Projeto de Lei, Rodrigo Alvim ressalta que o cenário ainda é incerto. “É difícil prever o que pode acontecer, porque tudo depende de lobby e de pressões”, comenta.

Caso aprovado e sancionado, caberá à ANAC adaptar as normas, revogar trechos da Resolução 400 e editar novas regras operacionais para garantir a aplicação das mudanças.

Fontes:

Marco Antonio Araujo Júnior, advogado e presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB

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