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sábado, outubro 18, 2025
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Direitos do consumidor de serviços de hospedagem à luz da Portaria n.º 28/2025 do Ministério do Turismo

O debate sobre a duração da diária em estabelecimentos de hospedagem, bem como sobre a partir de quais horários seria possível ingressar e se retirar das unidades, tem suscitado diversas dúvidas e inseguranças junto a consumidores e a estabelecimentos de hospedagem. Embora a Lei n.º 11.771/2008 (Lei Geral do Turismo), em seu art. 23, § 4º, defina a diária como correspondendo ao período de 24 horas, dúvidas sobre os horários de entrada e saída dos hóspedes nas unidades, bem como dedução do valor correspondente ao interregno entre o horário limite para check out e horário inicial para check in, seguiram sem respostas adequadas por parte da legislação.

Referida insegurança jurídica levou a iniciativas como a do Projeto de Lei n.º 3.788/2025 do Estado de Minas Gerais, o qual tinha por objetivo fixar a diária em 24 horas corridas e ininterruptas, bem como estabelecer horários rígidos para entrada e saída de hóspedes, não podendo ser exigido do hóspede check out antes das 12 horas do dia correspondente ao encerramento da última diária contratada, conforme art. 3º, § 1º, da proposta legislativa.

Diante desse cenário de insegurança e a fim de dar maior transparência ao processo de entrada e saída de hóspedes em unidades hoteleiras, foi editada, no dia 16 de setembro, a Portaria n.º 28/2025 do Ministério do Turismo, a qual regulamenta o art. 23, § 6º, da Lei n.º 11.771/2008, estabelecendo critérios mais específicos sobre check in e check out, bem como sobre procedimentos de limpeza e arrumação de quartos.

A portaria vale para todos os tipos de hospedagem definidos pela Lei Geral do Turismo, abrangendo hotéis, pousadas, resorts, flats, hostels ou ainda albergues. Todavia, o Ministério do Turismo fez a ressalva de que a normativa não se aplica para imóveis alugados por meio de plataformas digitais, como Airbnb ou Booking, o que não afasta dessas plataformas deveres impostos pelo Código de Defesa do Consumidor, como, por exemplo, o dever de informação clara e adequada sobre a reserva, como apresentar claramente quais os horários de entrada e de saída.

Embora publicada no dia 15 de setembro, a portaria entrará em vigor somente 90 dias após a sua publicação, ou seja, em 15/12/2025. Contudo, diante da relevância da temática, bem como da iminência da sua entrada em vigor, uma análise das alterações por ela trazidas se faz necessária, tanto por parte dos estabelecimentos de hospedagem quanto dos consumidores.

Em um primeiro momento, a normativa confirma o art. 23, § 4º, da Lei n.º 11.771/2008, dispondo que o preço da diária corresponde ao período de 24 horas, deixando de fixar horários rígidos para check in e check out, os quais poderão ser definidos pelo prestador dos serviços em atenção ao princípio da liberdade contratual. Além disso, a portaria prevê que os estabelecimentos de hospedagem possuem o período de até 3 horas nos dias de entrada e de saída para realizar limpeza e arrumação da unidade habitacional. Isso significa que, se um estabelecimento definir o meio-dia como horário limite para o check out, não poderá fixar check in em horário posterior às 15 horas do mesmo dia – o que não impede que o estabelecimento reserve um período inferior ao de 3 horas entre o check out e o check in, a depender da natureza do negócio e do tempo necessário para limpeza da unidade habitacional.

De acordo com a portaria, a reserva de 3 horas para limpeza e arrumação da unidade é considerada parte integrante da diária de 24 horas, não caracterizando, portanto, prestação onerosa adicional e não sendo passível de abatimento do valor cobrado pela diária. O referido intervalo se presta a permitir ao estabelecimento realizar a limpeza e a arrumação da unidade habitacional antes do ingresso do novo hóspede – obrigação legal imposta aos meios de hospedagem, salvo no caso de dispensa expressa pelo hóspede.

Embora a portaria confira liberdade aos estabelecimentos de hospedagem para definição de horários de entrada e saída em suas unidades, ela lhes impõe o dever de informação específica quanto aos horários estabelecidos, bem como quanto ao tempo estimado para limpeza e organização da unidade habitacional, o que vai ao encontro do dever geral de informação previsto no art. 6, III, do CDC. O referido dever também se aplica aos intermediários que atuem na comercialização dos serviços de hospedagem, em um claro reconhecimento da solidariedade na cadeia de prestação de serviços.

 

Por outro lado, apesar de conferir aos estabelecimentos o direito de reservar até 3 horas da diária nas datas de entrada e saída nas unidades, a portaria prevê a possibilidade de entrada antecipada ou saída postergada mediante a prática de tarifas diferenciadas, autorizando, portanto, o uso extraordinário da unidade habitacional por parte do hóspede. É a consolidação dos chamados early check in e late check out, práticas comerciais que, embora já adotadas pela indústria hoteleira, ainda careciam de disciplina normativa.

 

A edição da Portaria n.º 28/2025 deve ser percebida como uma evolução à normativa encampada na Lei n.º 11.771/2008, trazendo maior segurança jurídica para um cenário até então incerto e resguardando direitos tanto dos consumidores quanto dos estabelecimentos de hospedagem. O presidente do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil (FOHB), Orlando Souza, classificou a reserva de até 3 horas para limpeza e arrumação como “adequada e flexível”.

Por um lado, os consumidores passam a ter maior transparência quanto aos horários de check in e check out , bem como quanto ao tempo reservado para limpeza da unidade, enquanto os estabelecimentos de hospedagem possuem agora um respaldo legal para a reserva de horas destinadas à limpeza e à arrumação das unidades individuais – o que não configura uma vantagem excessiva para o estabelecimento, mas apenas um período destinado para que o prestador dos serviços possa cumprir uma obrigação que lhe é imposta pela legislação, qual seja, a de providenciar a limpeza e a arrumação da unidade habitacional entre a saída de um hóspede e a entrada de um novo.

*João Marcelo Raupp é advogado e atua nas áreas de Direito Civil e do Consumidor no Silveiro Advogados; é graduado em Direito, possui Curso de Extensão em Propriedade Intelectual na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialização em Segurança Digital, Governança e Gestão de Dados pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

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